Mina Guaíba é arquivada oficialmente pelo órgão ambiental gaúcho
Empreendimento seria a maior mineração de carvão a céu aberto da América Latina
Empreendimento seria a maior mineração de carvão a céu aberto da América Latina
Imagine sua cidade prestes a receber um empreendimento que irá trazer riscos graves de abastecimento e contaminação da água que você utiliza, além de uma série de danos ambientais que podem ser irreversíveis na sua região.
Para isso, a empresa responsável decide ignorar os moradores diretamente impactados e excluir seu município do relatório. É o que está acontecendo com várias cidades do Rio Grande do Sul, incluindo a capital, Porto Alegre.
Além dos já conhecidos impactos socioambientais que a implantação da Mina Guaíba causa, fica claro o descaso da COPELMI Mineração Ltda e da Fundação Estadual de Proteção Ambiental do Rio Grande do Sul (FEPAM), que licenciou o empreendimento.
Segundo os cientistas Iporã Possantti e Rualdo Menegat, é importante esclarecer que “a cidade de Porto Alegre capta água bruta para seu abastecimento em três pontos no Lago Guaíba, um ponto no Canal Navegantes e outro no Canal Jacuí […]”.
O licenciamento ambiental não previu uma série de riscos e impactos na qualidade da água do Rio Jacuí, responsável por 86,3% da vazão média de aporte ao Lago Guaíba, ou seja, é o maior responsável pela quantidade de água.
Em época de cheias do rio, a estação de tratamento de efluentes ficaria completamente desprotegida, pois a água transbordada iria direto para o local da mina, retornando para o rio com todo o metal pesado da mineração – contaminada.
A empresa de mineração ignorou o cumprimento de fases e de procedimentos fundamentais, como a realização de audiências públicas em todos os municípios próximos à instalação da mina. A população de Porto Alegre, por exemplo, sequer foi ouvida.
Esse empreendimento coloca em risco toda a água da região. Outros municípios ignorados pela mineradora, como Canoas, Eldorado do Sul, Guaíba e Barra do Ribeiro, também se beneficiam da segurança hídrica oferecida pelo Rio Jacuí e seriam diretamente afetados pelo empreendimento.
No total, são mais de 4 milhões de pessoas impactadas.
Mapa cedido pelo cientista Rualdo Menegat ao Instituto Humanitas Unisinos
A FEPAM licenciou esse empreendimento sem levar em conta que o risco do rebaixamento de um lençol freático que abastece a população – outra consequência da mineração – é alto demais para que a instalação dessa mina seja permitida.
Portanto, insistimos e reforçamos que esse licenciamento não seja concedido, com o reforço de dados concretos e análises de cientistas renomados.
O Instituto Arayara, além de se preocupar com a proteção das comunidades tradicionais indígenas – foco da nossa primeira ação para impedir a Mina Guaíba -, também entende o perigo desse empreendimento para a qualidade da água que chega nas casas das pessoas, impactando especialmente os 4,3 milhões de habitantes da grande Porto Alegre.
Por isso, entramos com mais uma Ação Civil Pública e contamos com seu apoio para impedir a contaminação e destruição dos recursos hídricos do estado.
A ACP é mais uma forma que organizações como a Arayara – visando sempre a proteção ao meio ambiente e à sociedade – têm de cobrar providências de instituições como a COPELMI e a FEPAM, que colocam em risco e causam danos à população e seus territórios.
Enquanto aguardamos a Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, solicitamos que seja suspendido o licenciamento da Mina Guaíba até o final deste processo, que tem como objetivo impedir que se construa um empreendimento tão prejudicial ao meio ambiente e aos habitantes locais.
Através dessa ACP buscamos garantir o fornecimento de água saudável à grande Porto Alegre. Precisamos unir forças para mostrar os danos que a Mina Guaíba irá causar aos territórios e habitantes destes municípios, com a possibilidade de uma crise hídrica sem precedentes”.
Nicole Oliveira, diretora do Instituto Arayara
Se você apoia a ACP, assine aqui ou coloque um sticker de apoio no seu Facebook “Eu Apoio a Ação Civil Pública contra a Mina Guaíba”.
A Justiça Federal, através da 9ª Vara Federal de Porto Alegre, determinou nesta sexta-feira, 21, a suspensão imediata do processo de licenciamento ambiental do projeto Mina Guaíba. Segundo a juíza Clarides Rahmeier, que concedeu a liminar, os procedimentos só poderão seguir após análise conclusiva pela Fundação Nacional do Índio (Funai) do componente indígena. A liminar atende à solicitação feita através de Ação Civil Pública movida pelo Instituto Internacional Arayara que, com seus técnicos e advogados balizaram os erros cometidos pela Copelmi e Fepam, e pela Associação Indígena Poty Guarani, protocolada em outubro de 2019. A ACP tem o apoio e a participação da 350.org e do Observatório do Carvão Mineral.
O Estudo e o Relatório de Impacto Ambiental (EIA-RIMA) do projeto ignorou a presença de aldeias indígenas na área diretamente afetada pela mina Guaíba. O erro foi cometido tanto pelo órgão ambiental licenciador, Fepam, quanto pelo empreendedor, Copelmi. A legislação vigente é muito clara e objetiva: os licenciamentos devem ter consulta prévia, livre e informada dos povos indígenas e tradicionais. No caso da mina Guaíba, foram excluídos os indígenas da Aldeia (TeKoá) Guajayvi.
A Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT) afirma que sempre que uma medida ou ato administrativo ou legislativo do Estado possa ocasionar dano ou ameaça de dano a direitos, o povo afetado deve ser consultado previamente para oferecer seu consentimento. A OIT 169 determina, no artigo 6°, que os povos devem ser consultados mediante procedimentos apropriados através de suas instituições representativas. Completa o artigo que a consulta há de ser feita de boa-fé.
Além de não terem sido consultados, os indígenas da Aldeia Guajayvi podem ser removidos à força. Além disso, caso a mina seja licenciada, eles teriam conviver com explosões e abalos sísmicos diuturnamente, durante cerca de 30 anos; com emissões de gases tóxicos e contaminantes na atmosfera; respirariam materiais particulados carregados de mercúrio; conviveriam com alterações e degradação toda a paisagem cênica do entorno de seu território; haveria dificuldades de obtenção de água potável e de qualidade. Ou seja, mazelas irreparáveis e incontroláveis permeariam a vida na aldeia.
O projeto de mineração de carvão, areia e cascalho, localizado nos municípios de Eldorado do Sul e Charqueadas, apresenta sérios riscos aos indígenas e a mais de 4,5 milhões de pessoas que vivem no entorno, incluindo Porto Alegre e região metropolitana.
A juíza que concedeu a liminar salientou que “o componente indígena deve ser incluído no Estudo de Impacto Ambiental e respectivo Relatório de Impacto Ambiental (EIA/Rima), antes de eventual emissão de Licença Prévia pela Fundação de Proteção Ambiental (Fepam)”. Cabe recurso da decisão ao TRF4.
Intimado, o Ministério Público Federal (MPF) manifestou-se favoravelmente ao pedido da liminar. Disse o Procurador da República, Pedro Nicolau Moura Sacco, em seu despacho: “Sem qualquer contato com os indígenas, tampouco houve algum movimento por parte da FEPAM e da Copelmi no sentido da realização da consulta prévia da Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho sobre direitos dos povos indígenas e tribais”.
Renan Andrade, gestor ambiental da 350.org que atua no Rio Grande do Sul, considera a concessão da liminar uma vitória importante. “Essa é uma vitória da justiça, das leis e dos povos indígenas. A mina Guaíba, se instalada, será um verdadeiro desastre e colocará em risco a vida de mais de 4,5 milhões de pessoas, seja pela exposição ao material particulado 2.5 (pm 2.5), seja pelos materiais cancerígenos que são liberados com a exploração do carvão. Seguiremos na batalha para impedir a implantação desse desastre chamado mina Guaíba”, disse.
Para Juliano Bueno de Araújo, diretor de campanhas da 350.org, da Arayara e do Observatório do Carvão Mineral “os indígenas que vivem na região já estão sendo afetados pela Mina Guaíba, quando os responsáveis pelo projeto tentam apagar sua existência e passar por cima da consulta obrigatória que deveriam fazer, mas a comunidade não vai deixar que isso aconteça”.
Já Nicole Oliveira, diretora da 350.org na América Latina, da Arayara e do Observatório do Carvão Mineral, refletiu sobre os impactos da mina: “Apesar dos alertas de diversos pesquisadores sobre os efeitos negativos da mina e de a população dizer ‘não’ ao projeto, a Copelmi insiste em levar adiante esse projeto falido” .
Um dos mais reconhecidos geólogos do mundo, Rualdo Menegat, professor do Departamento de Paleontologia e Estratigrafia do Instituto de Geociências da UFRGS, concedeu entrevista ao Observatório do Carvão e explicou por que a Mina Guaíba não pode sair do papel. Os argumentos do professor são irrefutáveis e precisam ser levados à população, pois são os moradores da região metropolitana de Porto Alegre os principais atingidos pelos males que a exploração do carvão mineral pode gerar. Confira a entrevista:
O Rio Grande do Sul precisa de uma mina de exploração de carvão?
No século XXI ninguém mais quer minas de carvão, ainda mais perto de casa. Trata-se de uma fonte de energia obsoleta e a mais agressiva ao meio ambiente. A Mina Guaíba, por exemplo, pretende se instalar no coração da Região Metropolitana de Porto Alegre, a 16 km do centro da capital, com potencial de impacto negativo à vida e ao patrimônio ambiental, material e cultural de 4,6 milhões de pessoas. Esse projeto oferece um risco tão grande a essa população que não valeria a pena implantá-lo, nem mesmo se o Rio Grande estivesse vivendo uma grave crise energética, que não é o caso. Uma mina de carvão tão próxima de um gigantesco aglomerado urbano e da água que o abastece pode causar sérios danos à saúde de seus habitantes. Então, é contraditório dizer que ela é necessária para fornecer energia à população, quando na verdade ela pode matar os consumidores dessa energia e degradar sua qualidade de vida. O Rio Grande do Sul tem vocação pioneira para inovar fontes de energia, como os parques eólicos. Então porque insistir em fontes de energia dos séculos XVIII e XIX?
Além disso, a exploração de carvão nunca trouxe riqueza para as regiões onde ela é realizada. Em qualquer lugar do mundo, essas minas trazem severos danos ambientais e empobrecem os habitantes locais. Quem quer visitar um lugar degradado pela mineração de carvão? Ninguém. Então, as minas de carvão afugentam as pessoas. Quando o ex-vice-presidente norte americano, Al Gore, visitou a região carbonífera dos Apalaches, nos Estados Unidos, ele disse que se um estrangeiro tivesse feito todo aquele estrago na paisagem, eles teriam que declarar guerra contra eles, tamanha a destruição do ambiente que essa mineração tem causado naquele país.
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