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Organizações do Acordo de Glasgow fazem webnário nesta quinta, 4

As organizações da sociedade civil sul-americana que integram o Acordo de Glasgow realizam nessa quinta (4) webnário para discutir a sequência da iniciativa.  O Acordo foi elaborado por organizações de várias regiões do mundo a partir da constatação de que as Conferências das Partes (COP) da Convenção da ONU sobre Mudanças Climáticas pouco ajudam a reduzir a emissão dos gases de efeito estufa e que o somatório dos compromissos individuais dos países para reduzirem suas emissões e os próprios acordos internacionais não têm sido suficientes para tratar a emergência climática.

No evento de (que acontece às 16 horas e pode ser acompanhado online) vão apresentar os cenários nacionais de emissões Xiomara Acevedo (da organização Barranquilla +20, da Colômbia), Antonio Zambrano (MOCICC, do Peru), Rodrigo Hormiga (Fundación Gaia Pacha, da Bolívia) e Nicole Oliveira (Arayara, do Brasil).

O Acordo de Glasgow, que foi elaborado a partir de abril e assinado em novembro de 2020, leva o nome da cidade em que se realizaria em dezembro a 26ª Conferência das Partes, a COP26. Em abril de 2020, a ONU adiou a COP26 para o final de 2021 devido à pandemia de coronavírus.

“Há uma questão de co-responsabilidade nos compromissos e ações para reduzir as emissões de gases do efeito estufa, razão pela qual é importante que as organizações da sociedade civil sejam parte ativas deste processo, acrescentando investigação e informação local, educação e socialização e, claro, a geração e apresentação de propostas. Desta forma, podemos gerar um maior alcance e resultados muito mais eficazes”, avaliou Rodrigo Hormiga, da Fundación Gaia Pacha.

“Como organizações da sociedade civil podemos contribuir com a geração de informação local e a sua disseminação em diferentes espaços e continuar a motivar a participação que temos com outros aliados e levar a cabo estas propostas de uma forma colaborativa e articulada”, completou Rodrigo.

As organizações também vão debater o lançamento, no primeiro semestre de 2021, de inventários de projetos e setores econômicos em cada um dos quatro países. Serão denunciados projetos que impactem especialmente populações vulnerabilizadas (no Brasil populações negras, ribeirinhas, quilombolas, indígenas e camponesas, entre outras).

“Vamos focar em projetos emblemáticos e em setores da economia, para sabermos quais projetos precisam deixar de existir ou passar por uma transição energética ou de modelo de negócio para reduzir as emissões em 50% até 2030”, informou Nicole Oliveira, diretora do Instituto Arayara, um dos representantes no Brasil do Acordo de Glasgow.

Nicole adiantou que as organizações do Acordo de Glasgow também farão “uma agenda de justiça climática para atender as populações mais vulneráveis – como a população negra, indígenas, ribeirinhos e pescadores -, que são as mais impactadas pelas mudanças climáticas e pelos causadores das mudanças, como projetos de mineração e de produção de combustíveis fósseis, de desmatamento e de expansão da pecuária e da monocultura. O terceiro passo serão ações da sociedade civil para redução dessas emissões”.

 “Infelizmente temos de esperar mais um ano para atuar, enquanto as emissões de gases causadores das mudanças do clima continuam aumentando, o uso dos combustíveis fósseis continua se expandindo e o desmatamento, crescendo”, concluiu Nicole.

A íntegra do Acordo de Glasgow está aqui, em Português: https://glasgowagreement.net/pt/agreement/

PL 318/2021: Querem tornar a exploração aos animais um patrimônio

Legitimar a exploração e tortura de animais como argumento econômico. Essa é a proposta do projeto de lei 318/2021 que – acredite – quer transformar a ‘criação de animais’ em patrimônio cultural imaterial.

O projeto, criado pelo deputado Paulo Bengtson, abre precedentes para o aumento da exploração animal e, se for aprovado e posteriormente sancionado como lei, favorecerá diretamente maior tortura, violência e abuso dos animais. Ou seja, a barbárie será normalizada.

A proposta real do projeto é dar permissão oficial para que “fábricas” de filhotes aumentem suas produções agravando os maus-tratos das fêmeas como objeto deplorável de procriação.

O PL também vai aumentar a margem do tráfico de diversas espécies, justificará o confinamento e a depressão dos animais em zoológicos, rodeios, caça, trabalho escravo animal, criação e abate clandestinos sem fiscalização, entre tantas outras práticas bizarras.

O texto do projeto evidencia, como entretenimento cultural e algo a ser enaltecido, as vaquejadas, os rodeios, as exposições de gado, cavalos, cães e gatos, competições entre os animais e tantas outras formas de exploração e tortura, destacando, ainda, criadouros comerciais e zoológicos como forma de educação ambiental.

Dentro da busca pela defesa da vida, em todas as suas formas, a Arayara sempre se posicionará contra iniciativas que visam objetificar vidas e transformar a relação do ser humano com os animais – que deveria ser de proteção – em uma transação comercial.

Este absurdo está disponível no site da Câmara dos Deputados e vocês podem ver o texto da proposta parlamentar na íntegra aqui.

Leia com atenção e vote: DISCORDO TOTALMENTE.

Participe dessa campanha. Doe seu tempo votando, contribuindo. Seja a favor da NÃO exploração de qualquer espécie.

Plenário do STF julga ADPF do Conama na sexta, 5

Foto: Paulo de Araújo/MMA

Os 11 ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) julgam em plenário virtual na próxima sexta-feira (5) a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 623 contra o Decreto 9.806, de maio de 2019, com o qual o Presidente Jair Bolsonaro  modificou, sem consultar agências do Estado ou organizações da sociedade, as regras de escolha dos membros do Conselho Nacional do Meio Ambiente (CONAMA).

Relatada pela Ministra Rosa Weber, a Arguição julgará se são constitucionais os critérios definidos por Bolsonaro para escolher os integrantes do órgão que decide as normas de praticamente todas as atividades econômicas no País – da qualidade do ar e da água à pesca, mineração e muitas outras áreas. A relatora da ação é a Ministra Rosa Weber.

A ADPF foi impetrada em setembro de 2019 pela ex-Procuradora-Geral da República (PGR), Raquel Dodge. Na sua petição, Dodge argumentou que o Decreto bolsonarista é inconstitucional e significa um “retrocesso institucional” por violar o direito de participação popular direta no Conama.

O Decreto reduziu o número de assentos destinados à sociedade civil no Conselho e determinou que os representantes das entidades ambientalistas fossem escolhidos por sorteio, e não mais por votação entre as organizações da sociedade civil de âmbito nacional, como era feito anteriormente.

Antes da intervenção de Bolsonaro, o Conama era integrado pelo presidente do Ibama, um representante de cada um dos Ministérios Casa Civil, Economia, Infraestrutura, Agricultura, Minas e Energia, Desenvolvimento Regional, Secretaria da Presidência da República. Também tinham assento no órgão um representante de cada região do País indicados pelos governos estaduais, dois representantes das capitais estaduais, quatro ambientalistas e dois representantes indicados pelas Confederações Nacionais da Indústria, do Comércio, de Serviços da Agricultura e do Transporte.

“O decreto atingiu justamente as entidades ambientalistas, o único setor do Conama que escolhia seus membros por votação democrática”, criticou o biólogo e arquiteto Francisco Milanez,  presidente da Associação Gaúcha de Proteção ao Ambiente Natural (Agapan).

O Diário Oficial da União publicou no dia 3 de fevereiro de 2021 o resultado do sorteio indicando a Agapan, que 25 de abril completará 50 anos de atividades, como a primeira entidade ambientalista a ser escolhida nas novas regras para integrar o Conselho.

Mas, na Carta aos Brasileiros, a Associação rejeitou a escolha por sorteio e denunciou “que não viveu, nesse meio século de ativismo ininterrupto, nenhum momento tão negativo para o meio ambiente e para a população de nosso país quanto o atual”.

 Na APDF atuam como amicus curiae  várias organizações da sociedade civil que terão direito a voz (a chamada sustentação oral) no julgamento da próxima sexta.

Amicus curiae (numa tradução livre, amigo da causa) é uma expressão em latim que designa uma instituição que subsidia com informações as decisões dos magistrados. Os amicus não são parte do processo, são apenas uma espécie de assistentes.

Mesmo sem ter esse objetivo, o Decreto bolsonarista jogou luzes sobre um antigo problema: a ampla predominância dos representantes de governo no Conama, e que muitas vezes defendiam interesses do setor privado, em detrimento de uma participação equânime com outros setores da sociedade.

“Sempre existiu um problema crônico e sistêmico no Conselho e o decreto de 2019 piorou ainda mais a situação do Conama como fórum elaborador de políticas públicas ambientais”, avalia a especialista em políticas públicas se segurança química Zuleica Nycz, coordenadora da organização Toxisphera, uma das entidades qualificadas como amicus curiae. Um representante da Toxisphera falará no julgamento.

“O desequilíbrio entre o número de conselheiros que representam estritamente a defesa e preservação ambiental e o número de representantes de interesses parciais, notadamente os de natureza de política governamental, econômica e outros, repousa no fato de que a esmagadora maioria de assentos do colegiado já havia sendo concedida por sucessivos decretos desde a década de 1990 a quem não tenha a finalidade exclusiva de defender e preservar o meio ambiente”, observa Zuleica, que integrou por quase 10 anos o Conama da década de 2000 e foi eleita por organizações da região Sul do País.

Outro ex-integrante do Conama, o Procurador Regional da República em São Paulo José Leônidas Bellem de Lima, que representou o MPF entre 2012 e 16, vai na mesma linha.

 “Em governos passados, ainda que “de modo crônico, localizado e praticamente invisível na cena pública nacional”,  já vinham sendo minados os meios à disposição da sociedade para, nesses colegiados, fazer valer suas posições na elaboração e no acompanhamento de políticas públicas ambientais”, defendeu em artigo publicado na revista Jota.

Várias outras organizações da sociedade também estão qualificadas como amicus curiae e terão direito a voz no julgamento. Essas organizações têm natureza, objeto de trabalho e abrangência muito variadas – o que mostra a complexidade do ação que será julgada.

São elas: partido Rede Sustentabilidade, Câmara Brasileira da Indústria da Construção, Associação das Empresas de Loteamento e Desenvolvimento Urbano, sindicato das empresas imobiliárias de São Paulo, as Associações do Ministério Público e do Ministério Público do Meio Ambiente, Associação Nacional dos Membros do Ministério Público, Instituto Socioambiental, Transparência Internacional, Observatório do Clima, Rede de Organizações Não-Governamentais da Mata Atlântica, Conectas Direitos Humanos, Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil e WWF Brasil.

Tempestade no Acre: falta de vacina, chuvas e crise migratória

O Acre vive a tempestade perfeita. Enfrenta a Covid-19, o Ministério da Saúde que distribui vacinas a conta gotas, pesadas chuvas nos vales dos rios Acre e Juruá que deixam debaixo d´água Cruzeiro do Sul (com 89 mil habitantes e distante 635 km de Rio Branco) e uma crise migratória.

Fechada pelo governo do Peru para evitar a entrada de brasileiros, a Ponte da União entre Assis Brasil (7,5 mil habitantes, a 345km da capital) e Iñapari (Peru), por onde passa todo o comércio rodoviário entre os dois países, cerca 200 haitianos que migram em direção ao Canadá montaram precários acampamentos e aguardam autorização para deixar o Brasil, embora a Ponte tenha previsão de reabertura apenas em setembro.

O Acre é um dos principais eixos de migração de haitianos, que nos anos anteriores foram atraídos pela economia em alta e a possibilidade de arranjar empregos em várias cidades brasileiras. “Por aqui passaram mais de 50 mil migrantes que se dispersaram pelo Brasil”, lembra Raimunda Bezerra, coordenadora do Centro de Defesa dos Direitos Humanos e Educação Popular do Acre.

“Eles chegaram em diáspora haitiana, quando o Brasil estava em melhor situação econômica. Agora, sem emprego e sem o auxílio emergencial, estão saindo do Brasil através do Peru. Eles planejam passar pelo Equador, onde não há controle de fronteira, chegar ao México e, de lá, partir para o Canadá. A eleição do Presidente Joe Biden nos Estados Unidos chamou a atenção deles”, explica Raimunda, que lamenta falta de atenção do Ministério das Relações Exteriores do Brasil para o problema.

Chuvas e falta de vacinas agravam a crise

Segundo o jornal Folha do Acre, as chuvas que caem em Cruzeiro do Sul desde o início de fevereiro fez o rio Juruá transbordar e atingir o maior nível da história (14m36cm). No Estado, o período chuvoso vai de 8 de outubro a 26 de abril.

O governo do Acre aumentou de 60 para 106 o número de leitos de UTI em todo o Estado, mas, segundo a Secretaria Estadual de Saúde, apenas cinco unidades estão disponíveis. O Acre deve entrar em bloqueio total (lockdown) nos sábados e domingos a partir na semana que vem, informou o governador Gladson Cameli ao canal de notícias CNN Brasil.

Na região do Juruá, que engloba as cidades de Cruzeiro do Sul, Tarauacá e Marechal Thaumaturgo e está no epicentro das chuvas torrenciais, 25 dos 26 leitos de UTI estão ocupados, enquanto as vacinas contra COVID-19 chegam aos poucos e não através de grandes esquemas de logística, que no passado caracterizavam o sistema público brasileiro de vacinação como o melhor do mundo.

Em vez de o Ministério da Saúde distribuir imunizantes aos milhões – como fez durante décadas até erradicar doenças transmissíveis como sarampo e poliomielite -, agora as vacinas chegam em pequenos compartimentos de bagagem de helicópteros e aviões.

Nesta quarta (24), o Presidente Jair Bolsonaro visitou Rio Branco e, segundo apurou o jornal Acre 24 horas, teria levado 14 mil doses de vacina – informação não confirmada pelo Ministério da Saúde. Os mais recentes números do IBGE mostram que o Acre tem cerca de 895 mil habitantes.

“Banho-maria nuclear por uma década”, aponta Roberto Kishinami

Aparentemente, o principal foco da Medida Provisória (MP) 988, aprovada no dia último e enviada à sanção do Presidente Jair Bolsonaro, deveria tratar dos critérios de reajuste de tarifas de energia elétrica nos próximos anos. Mas, esmiuçada por quem monitora há décadas o setor energético, a MP revela outros objetivos.

“O que a 998 fez mesmo foi consolidar as térmicas a gás natural liquefeito importado operando na base as próximas grandes obras do sudeste, em substituição às hidrelétricas do passado”, analisa o físico paulista Roberto Kishinami, coordenador do Instituto Clima e Sociedade, um dos principais pesquisadores brasileiros no tema da transição energética.

Esmiuçar os objetivos e definições dessa MP – que saiu do Palácio do Planalto em 2020, tramitou rapidamente pela Câmara dos Deputados e o Senado e já retornou à sanção presidencial – é importante para compreender as políticas públicas que serão adotadas nos próximos anos em matéria de energias renováveis, hidroeletricidade e conservação de energia.

Mas, fundamentalmente, também ajuda a entender as entrelinhas da MP 998 ajuda a montar o quebra-cabeças do setor nuclear, área em que predomina a opacidade institucional e por onde fluem bilhões de reais de dinheiro público com pouquíssima supervisão do público e até dos órgãos de controle interno do Estado Brasileiro, como a Controladoria-Geral da União, o Tribunal de Contas da União e o Ministério público federal.

Segundo Kishinami, que entre 1994 e 2001 dirigiu o Greenpeace Brasil, com a MP 998 o Ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, está “garantindo que esse setor continue pendurado no Orçamento por mais algumas décadas”.

De fato: entre outras medidas, a MP possibilitará ações de longo alcance, como a transferência para a União das ações de titularidade da Comissão Nacional de Energia Nuclear (a CNEN, que deve ser substituída parcialmente nos próximos anos por uma agência reguladora do setor nuclear, ainda a ser criada, e que assumirão parte das atribuições da Comissão).

Além de indicar a criação de um novo ente regulatório, a 998 também possibilitará uma reorganização do capital e dos contratos sociais das empresas estatais Indústrias Nucleares do Brasil S.A. (INB, encarregada da pesquisa e lavra de minerais radioativos), e da Nuclebrás Equipamentos Pesados S.A. (Nuclep).

A seguir, Kishinami aponta alguns rumos que podem seguir o setor de energia no Brasil a partir da provável sanção da MP por Bolsonaro.

O que a MP 998 significa especificamente para a área de energias renováveis, que vêm tendo uma boa expansão nos últimos anos, no Brasil?

Para as renováveis em geração centralizada o efeito não é imediato. Como o crescimento delas está acelerado no mercado livre, o impacto vai ser sentido nos novos empreendimentos.

E para o setor nuclear, que parece ser o principal obejtivo da MP?

Angra 3 não vai ser privatizada e tampouco completada. O que a 998 fez foi manter o “banho maria” por mais uma década. O mandato do (Ministro das Minas e Energia) Bento Albuquerque é consolidar o Programa Nuclear Brasileiro, algo que ele está fazendo “pelas beiradas”, ajeitando a INB e encaminhando a mineração em (Santa) Quitéria, no Ceará (onde a INB quer explorar urânio e fosfato, em consórcio com a empresa privada Galvani), ao mesmo tempo em que arruma o tapete que esconde Caetité, na Bahia (onde há seríssimos problemas ambientais e sociais deccorrentes de anos de mineração do urânio). Como ele não sabe quando sai – com o Centrão de olho na cadeira dele -, está garantindo que esse setor continue pendurado no Orçamento por mais algumas décadas.

O que a 998 fez mesmo foi consolidar as térmicas a gás natural liquefeito importado operando na base as próximas grandes obras do Sudeste, em substituição às hidrelétricas do passado. Elas vão inclusive deslocar o Mecanismo de Realocação de Energia (o MRE, instrumento para compartilhar os riscos hidrológicos no Sistema Elétrico Integrado nacional) e criar uma conta gigantesca para os consumidores daqui a alguns anos.

Pela sua argumentação, o programa nuclear virou um fim em si mesmo? Ou seja, ele visa somente a se refinanciar e manter um fluxo mínimo de recursos orçamentários, é isso?

Exatamente. Em todo mundo essa é uma área que só orçamentos federais conseguem manter. É uma “mamação” eterna.

O que os críticos do Programa Nuclear Brasileiro argumentam é que, por trás dele e de suas frequentes renovações, há o interesse dos militares em dar escala ao setor para viabilizar técnica e economicamente os seus próprios interesses na área atômica. Mesmo que não seja para viabilizar a bomba, mas para viabilizar navios e submarinos com propulsão nuclear. O que o Sr. Acha disso?

Eles estão se divertindo o suficiente com o submarino nuclear (os cascos de vários deles está sendo construído no estaleiro da Odebrecht na cidade de Itaguaí, no Rio de Janeiro, como resultado do programa militar desenvolvido com o governo da França). Navios não teriam qualquer utilidade prática. Seriam só bons alvos, dependendo de onde estivessem.

O que conta para a armada é ter um programa que lhes permita fazer parte dos vários comitês internacionais sobre nuclear, desarmamento etc. Hoje, acredito que nunca quiseram ter, de fato, um artefato nuclear. Sempre falaram em “ter a capacidade de fazer”. Algo como “saber ler as receitas que o Google oferece”.

Então, a rigor, os militares não querem ter a capacidade atômica? Querem ter a esses espaços e acesso a recursos muito grandes do orçamento público?

É isso mesmo.

“Boiada” nuclear: Bolsonaro pode aprovar privatização de Angra 3

“Boiada” nuclear: Bolsonaro pode aprovar privatização de Angra 3

Foto: Clube de Engenharia

Enquanto o Senado autorizava na quinta (4) o Brasil a participar da iniciativa da Organização Mundial da Saúde (OMS) para distribuir vacinas contra Covid-19, foi aprovada sem alarde, como as boiadas planejadas pelo Ministro do Meio Ambiente Ricardo Salles, a Medida Provisória (MP) 998, que permite a privatização da usina nuclear Angra 3 – se e quando esta for concluída.

Originada na Câmara dos Deputados no ano passado, a MP, que teve tramitação acelerada e também trata do reajuste das tarifas de eletricidade, caducaria nesta terça, 9. Agora, vai à sanção do presidente Jair Bolsonaro. O Ministro das Minas e Energia, Bento Albuquerque, esteve presente à votação no Senado.

O texto autoriza o aumento da tarifa para subsidiar a energia a ser gerada por Angra 3. Segundo o governo, Angra 3, cuja construção está suspensa e que deveria ter entrado em operação na década de 1980, já teria 67,1% das obras civis – o equivalente às fundações de uma casa. Até hoje, todo o projeto teria consumido R$ 9 bilhões do orçamento público, e ainda seriam necessários mais R$ 15 bi para sua conclusão.

A MP foi enviada para a Secretaria-Geral da Presidência da República , que informou: “A Subchefia para Assuntos Jurídicos (SAJ), órgão responsável pela assessoria e consultoria jurídica no âmbito da Presidência da República e da Vice-Presidência da República, aguarda o envio do autógrafo da matéria pelo Senado Federal. Após o recebimento, o prazo para análise é de 15 dias úteis”.

A decisão do Senado é controversa. Para gerar energia, Angra 3 consumiria o mineral urânio, mas a Constituição afirma, no artigo 21, inciso 23, que é monopólio da União a pesquisa, lavra, enriquecimento, processamento, industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados.

Na prática, a medida aprovada pelo Senado autorizaria a privatização de uma atividade que, pela Lei Maior do País, é atividade exclusiva da União.

“Entendo que há uma inconstitucionalidade material”, disse, consultado por Arayara.org, o advogado Anderson Medeiros Bonfim, professor assistente de Direito Constitucional na PUC de São Paulo. “Sob o pretexto de viabilizar a retomada das obras de Angra 3 (usina termelétrica nuclear), passou-se a permitir a sua exploração por parte da iniciativa privada através de autorização do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE)”, completou Bonfim.

“A exploração de Angra 3 por parte da iniciativa privada desconsidera o regramento constitucional relativo ao modelo de monopólio, bem como de demarcação entre os espaços público e privado e das possíveis confluências entre eles, quais sejam nas hipóteses de permissão fixadas pelo artigo 21, inciso XXIII, da Constituição”, afirmou.

O professor da Universidade Federal de Pernambuco, Heitor Scalambrini, que também integra a Articulação Antinuclear Brasileira, avalia que “essa MP abre a porteira para construção de novas usinas nucleares no País”.

“Uma simples Medida Provisória de interesses de lobistas muito poderosos consegue passar por cima da Constituição e apontar para abrir uma porteira para que as atividades nucleares no País sejam delegadas à iniciativa privada”, denuncia Scalambrini, doutor em energética pela universidade de Marseille, na França.

Ele acredita que a aprovação da MP esconde “interesses na privatização da Eletrobrás e na expansão do setor nuclear no país, inclusive para uso militar, além da construção de Angra 3 e de mais seis usinas no Complexo de Itacuruba, em Pernambuco, conforme prega o Plano Nacional de Energia de 2050”.