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Apesar dos Alertas Socioambientais, Candiota Persiste no Uso do Carvão

Apesar dos Alertas Socioambientais, Candiota Persiste no Uso do Carvão

Em janeiro deste ano, o Governo do Estado do Rio Grande do Sul assinou um protocolo de intenções com uma empresa de cimento e argamassa para viabilizar um investimento de mais de R$100 milhões na indústria carbonífera local.

 

A informação é da Tribuna do Pampa. O objetivo é ampliar a fábrica existente em Montenegro e instalar uma nova indústria em Candiota, ao lado da Usina Termoelétrica Candiota III.

 

 

Investimentos Que Custam A Saúde Da População E Do Meio Ambiente

Embora a notícia destaque os benefícios econômicos da nova indústria cimenteira em Candiota, é importante considerar os impactos ambientais e sociais associados à produção de cimento e à queima de carvão mineral.

A produção de cimento é um processo que exige muita energia , ao mesmo tempo que gera uma quantidade significativa de gases de efeito estufa, o que a caracteriza como uma prática poluente de ponta a ponta. Isso quer dizer que se a indústria de cimento fosse um país, seria o terceiro maior emissor de CO2 do mundo, atrás apenas da China e dos EUA. Além disso, estima-se que a produção de cimento seja responsável por cerca de 8% das emissões globais de CO2. Sua fabricação resulta na liberação de poluentes gasosos na atmosfera, como o dióxido de carbono (CO2), o maior responsável pelo aquecimento global.

Quanto à queima de carvão mineral, ela produz efluentes altamente tóxicos, como mercúrio e outros metais pesados, como vanádio, cádmio, arsênio e chumbo. A liberação de dióxido de carbono pela queima também causa poluição na atmosfera, agravando o aquecimento global e contribuindo para a chuva ácida.

 

Cimento E Co2: Construindo A Crise Climática

O concreto tem sido um dos materiais mais amplamente utilizados no mundo, principalmente na construção, sendo o cimento o principal componente dessa mistura que conta com areia, brita e água.

O impacto do cimento na crise climática inicia na extração e transporte de suas matérias primas, que representam apenas 10% de suas emissões. Já 90% das emissões estão atribuídas ao seu processo de fabricação, principalmente do clínquer – material que representa, em média, 50% da mistura que constitui o cimento, sendo obtido através da exposição da mistura de calcário e argila às temperaturas superiores à 1450ºC. O mesmo é responsável pelo endurecimento do cimento na presença de água.

Além disso, durante o processo de fabricação do clínquer nos fornos é necessário utilização de muita energia, muitas vezes sendo ela proveniente de carvão mineral ou gás natural, ambos combustíveis fósseis. Ao final desta conta, gera-se uma tonelada de CO2 para cada tonelada de cimento. Assim, percebe-se como toda a cadeia de realização do cimento gera extremos passivos ambientais que contribuem para o aquecimento global e para as injustiças socioambientais, haja vista que é a população vulnerabilizada a que mais sofre com os desastres ambientais que anualmente se agravam.

 

Apesar de sua problemática substituir o cimento poluente é uma iniciativa muito cara, porém possível, pesquisadores da universidade de Cambridge, desenvolveram e patentearam a fabricação de um cimento que realiza mais de 50% de reciclagem além de consumir menos matéria prima, utilizando de inspiração o processo de “lime-flux” técnica usada no processamento de reciclagem de aço.

O novo processo começa com resíduos de concreto provenientes da demolição de edifícios antigos. Este é triturado para separar as pedras e a areia que formam o concreto da mistura de pó de cimento e água que os une. O pó de cimento antigo é então usado em vez do fluxo de cal na reciclagem do aço. À medida que o aço derrete, o fluxo forma uma escória que flutua no aço líquido, para protegê-lo do oxigênio do ar. Depois que o aço reciclado é retirado, a escória líquida é resfriada rapidamente ao ar e transformada em pó que é virtualmente idêntico ao clínquer que é a base do novo cimento Portland. Em testes em escala piloto do novo processo, a equipe de Cambridge demonstrou esse processo de reciclagem combinado, e os resultados mostram que ele tem a composição química de um clínquer feito com o processo atual.

 

Os Impactos Regionais Da Indústria Fóssil

O Rio Grande do Sul tem enfrentado uma série de eventos climáticos extremos, como enchentes, secas e tempestades, que têm se tornado mais frequentes e intensos. Esses eventos são intensificados pela mudança climática, que é impulsionada em grande parte pela queima de combustíveis fósseis.

Candiota, no Rio Grande do Sul, é conhecida por sua indústria de carvão. A cidade abriga a maior jazida de carvão brasileira, com aproximadamente 38% do carvão nacional. A Usina Termelétrica que opera com o carvão mineral abundante é uma das principais fontes de emprego e renda para a região.

No entanto, a exploração e queima de carvão têm causado impactos ambientais significativos na região ao longo de suas cinco décadas de operação. A mineração de carvão resulta na remoção de grandes volumes de solo e rochas, gerando impactos ambientais significativos na paisagem, poluição do ar com sua queima e da água com a DAM, drenagem ácida de mina.

Além disso, as usinas termelétricas de Candiota, que operam com carvão mineral, são algumas das mais poluentes do país. Um relatório do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema) apontou as duas unidades ativas no município – Candiota III, da CGT Eletrosul, e Pampa Sul, da Engie – como as líderes em emissões de gases do efeito estufa (GEE) e entre as menos eficientes do país. A Pampa Sul aparece no topo do ranking, entre as termelétricas em atividade, com 2 milhões de toneladas de emissões de gás carbônico (CO2). A Candiota III aparece na sexta posição, com 1,6 milhão.

Em 2022 o Brasil concedeu R$ 80,9 bilhões em subsídios à indústria do petróleo e gás, um valor que é cinco vezes maior do que os incentivos voltados às energias renováveis. Esses subsídios acabam incentivando a indústria do petróleo e do carvão, apesar dos impactos ambientais significativos associados a esses combustíveis.

 

 

O Instituto Internacional Arayara tem feito esforços significativos para mitigar o impacto dos combustíveis fósseis no Brasil, incluindo a diminuição do uso de carvão mineral. Aqui estão alguns exemplos:

 

Projetos para a Redução do Impacto da Indústria de Combustíveis Fósseis

• A Arayara elaborou o estudo “Legado Tóxico”, em parceria com o Observatório do Carvão Mineral, que expõe os impactos da cadeia produtiva do carvão mineral na Usina Termelétrica Jorge Lacerda. Lançado durante a COP27, revela áreas residenciais e agrícolas contaminadas, colocando mais de um milhão de pessoas em risco à saúde. Os custos estimados para a recuperação ambiental e reparação dos danos ultrapassam R$1,5 bilhão.

• Criticou o Programa para Uso Sustentável do Carvão Mineral Nacional, apresentado pelo Ministério de Minas e Energia, por perpetuar a presença do carvão na matriz elétrica de modo antieconômico e não apresentar qualquer alternativa de transição justa para os trabalhadores do setor e o restante da população das regiões carboníferas do país.

• Realizou o 1º Congresso Internacional sobre a Obsolescência do Carvão Mineral em 2022, um evento híbrido realizado nos estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Ceará. Contando com a participação de setores acadêmicos, movimentos sociais e comunidades atingidas por empreendimentos fósseis.

Esses esforços demonstram o compromisso da Arayara em promover uma transição energética justa e sustentável no Brasil. A organização está trabalhando para garantir que essa transição seja participativa, inclusiva, responsável e universal, respeitando os trabalhadores, os territórios, as demandas populares e os princípios de dignidade humana e bem-viver, assim como a defesa do meio ambiente sadio para a atual e as futuras gerações.

Brasil lança maior leilão de petróleo e gás no ano mais quente da história!

Brasil lança maior leilão de petróleo e gás no ano mais quente da história!

Em plena crise climática, continuar explorando combustíveis fósseis é uma escolha inaceitável.

O Brasil lançou recentemente o maior leilão de petróleo e gás de todos os tempos, com 603 blocos exploratórios em oferta permanente de concessão (OPC) pela Agência Nacional de Petróleo (ANP). Isto representa uma ameaça aos povos tradicionais, áreas de preservação e animais sob risco de extinção. Muitos desses blocos estão localizados em áreas sensíveis do ponto de vista da sociobiodiversidade, o que sinaliza que é hora de repensar os rumos da gestão da energia brasileira. A emergência climática exige transição energética, não a expansão da exploração de petróleo. Priorizar fontes renováveis é urgente! A queima de combustíveis fósseis é uma das principais causas do aquecimento global, com responsabilidade inquestionável da influência humana.

A relação entre petróleo e mudanças climáticas é clara. A queima de combustíveis fósseis, como o petróleo, é uma das principais atividades humanas que causam o aquecimento global e, consequentemente, as mudanças climáticas. Quando esses combustíveis fósseis queimam, eles liberam gases de efeito estufa, principalmente dióxido de carbono (CO2), que retêm parte do calor irradiado pela Terra, tornando-o mais quente e possibilitando a ocorrência de vida no planeta. A influência humana na mudança climática e na elevação da temperatura de oceanos e continentes é considerada “inequívoca” pelos cientistas .

As mudanças climáticas já estão afetando a vida no Brasil. O aumento de desastres naturais, impactos diretos na saúde e problemas na produção de energia e alimentos são alguns dos efeitos do desequilíbrio climático no país. De norte a sul, secas históricas causam desabastecimento de água em centenas de municípios, além de chuvas intensas, que deixam mortos e desabrigados em curto período de tempo.

Apesar dos avanços na matriz energética brasileira, a perspectiva de leilões para expansão de áreas de petróleo e gás contradiz compromissos climáticos e representa riscos ambientais. A escolha entre fronteiras fósseis e sustentabilidade está diante de nós e precisa ser feita já!

Diga não ao leilão de petróleo e gás e sim à transição energética!
Assine a petição, posicione-se contra a Mega Liquidação de Blocos Exploratórios de Petróleo e Gás da ANP.

 

 

Amazônia Livre de Petróleo e Gás

Amazônia Livre de Petróleo e Gás

Nós, movimentos, redes, coletivos, organizações de povos indígenas, ativistas, defensores da natureza, comunicadores, acadêmicos, mulheres e habitantes da Amazônia, de outros biomas e de outras regiões do planeta, nos reunimos na cidade brasileira de Belém para discutir a participação e a contribuição dos povos indígenas da Bacia Amazônica e de suas costas caribenha e atlântica diante da atual crise climática.

 

Sabemos que nosso destino está entrelaçado com o da Amazônia, independentemente de onde estejamos no planeta. A interrupção do desmatamento é necessária e essencial para garantir a proteção da maior floresta tropical, mas não é mais suficiente. Em um momento em que a emergência climática está causando ondas de calor e eventos extremos sem precedentes em todo o planeta, a redução imediata da exploração, produção e queima de combustíveis fósseis, que são os principais responsáveis pelas emissões de gases de efeito estufa, deve ser uma prioridade absoluta. Se quisermos evitar o ponto de não retorno para a Amazônia e, consequentemente, o colapso climático, precisamos de uma política articulada de eliminação imediata dos combustíveis fósseis.

A Cúpula Amazônica é uma oportunidade para que os países que abrigam a maior floresta tropical do mundo assumam uma posição clara sobre seu futuro. Deixar o petróleo e o gás no solo é a demonstração de liderança de que precisamos para convocar outros países a fazer o mesmo, a fim de garantir as condições de vida do planeta.

Podemos liderar, a partir do Sul global, o esforço mundial para criar “zonas livres de combustíveis fósseis” e dar o exemplo, interrompendo a extração de petróleo e gás na Amazônia.

Nesse sentido, em harmonia com a Assembleia dos Povos da Terra, exigimos que os chefes de Estado dos países que compartilham o território da Amazônia tomem medidas concretas e eficazes para garantir a proteção desse território, que é fundamental para enfrentar a crise climática global e promover novas alternativas de desenvolvimento.

 

Para isso, os estados amazônicos devem: estabelecer uma data para o fim da produção de combustíveis fósseis; parar de oferecer novos blocos para exploração de petróleo e gás (convencional e não convencional/fracking) na região e em seu litoral; acabar com os lucros do setor e parar de subsidiar a exploração e a produção desses combustíveis; reorientar os subsídios atualmente concedidos aos combustíveis fósseis para a promoção da produção sustentável de produtos florestais e de energia renovável; iniciar um plano de fechamento e remediação para os combustíveis fósseis e a promoção da produção florestal e costeira sustentável a partir de energia renovável; reorientar os atuais subsídios aos combustíveis fósseis para a promoção da produção sustentável de produtos florestais e da costa amazônica a partir de energia renovável; iniciar um plano de fechamento e remediação para as áreas extrativistas existentes, envolvendo as populações afetadas.

 

  • Garantir os direitos territoriais e a Consulta Livre, Prévia e Informada dos povos e territórios afetados pela exploração de petróleo e gás, bem como a reparação e recuperação dos territórios afetados, com respeito à sua autonomia e autodeterminação.
  • Criar mecanismos de indenização para a população historicamente afetada por esse setor.
  • Fortalecer o papel das autoridades de comando e controle para evitar a impunidade das empresas responsáveis pela poluição e degradação ambiental.
  • Garantir as ações preventivas necessárias por parte das empresas para permitir uma ação rápida de limpeza e contenção de derramamentos de óleo e vazamentos de gás.
  • Gerar alternativas econômicas locais, respeitando a economia indígena e considerando a dependência de mão de obra e as necessidades básicas geradas pela entrada do setor de combustíveis fósseis nos territórios.
  • Iniciar a transição para um novo modelo energético que proteja a biodiversidade da Amazônia e seus povos como parte dos compromissos do Acordo de Paris, que considere as particularidades de cada território e evite novos impactos territoriais. Essa transição deve ser justa e popular, e deve se basear na discussão de um novo modelo energético que responda às necessidades dos povos, por meio de fontes de energia que gerem menos impacto e respeitem os limites ecológicos do planeta.
  • Exigir que os bancos privados e as instituições multilaterais deixem de financiar projetos de extração de combustíveis fósseis na Amazônia e que redirecionem os recursos para financiar medidas de restauração e recuperação das florestas amazônicas, bem como novos modelos de produção de energia que possam ser comunitários, cooperativos ou locais e dirigidos pelas próprias comunidades.
  • Apoiar a iniciativa de referendo no Equador para a não exploração de petróleo em Yasuní como medida de proteção dessa área de biodiversidade única no planeta.

 

Assinam este manifesto: 

5 Elementos Educação para Sustentabilidade,

Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB),

AIDA,

Associação Maranhense para a Conservação da Natureza (AMAVIDA),

Associação de Preservação do Meio Ambiente e da Vida (Apremavi),

ARAYARA Brasil,

ARAYARA Guyana,

ARAYARA Maranhão,

ARAYARA Suriname,

ARAYARA Internacional,

Articulação Antinuclear Brasileira,

Asamblea Ecologista Popular,

Associação Alternativa Terrazul,

Associação Movimento Paulo Jackson (Ética, Justiça, Cidadania),

Campaña Que Paguen los Contaminadores América Latina,

Centro Amazónico de Antropología y Aplicación Práctica,

Centro de Desarrollo Andino Sisay,

Centro de Desarrollo Humano (CDH/Honduras),

Centro de Estudios Humanistas Nueva Civilización,

Ciclos Vitales, Citizens’ Climate Lobby Colombia,

Claudia Renata Lod Mores,

Censat Agua Viva (Amigos de la Tierra Colombia),

Consejo Permanente para la Transición Energética Justa en Colombia,

ClimaInfo, Climalab Colombia,

Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB),

COESUS, Coalizão Não Fracking Brasil,

Comissão Pastoral da Terra (CPT),

CooperAcción, Coordinadora Regional de los Pueblos Indígenas de San Lorenzo (CORPI SL),

Corporación Yariguíes (GEAM),

Corporate Accountability America Latina, Defensores do Planeta, Derecho,

Ambiente y Recursos Naturales,

Força Ação e Defesa Ambiental (FADA),

 Foro Ciudades para la Vida,

Fórum Mudanças Climáticas e Justiça Socioambiental,

 Frente por uma Nova Política Energética para o Brasil,

Fridays For Future MAPA,

Fundação Grupo Esquel Brasil,

Grupo de Estudos em Educação e Meio Ambiente do Rio de Janeiro (GEEMA), Gestos,

Greenpeace Brasil,

Grupo de Financiamiento Climático para Latinoamérica y el Caribe,

GFLAC, Grupo de Trabalho Amazônico (GTA),

Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC),

Instituto Ambiental Viramundo,

Instituto Ecoar para a Cidadania,

Instituto Ecosurf, Instituto Floresta dos Unicornios,

Instituto Fronteiras, Instituto Mapinguari,

 Litigância Climática e de Direitos (LITIGA),

Movimiento Ciudadano frente al Cambio Climático (MOCICC),

Movimento Pela Soberania Popular na Mineração (MAM),

Nacionalidad Waorani del Ecuador (NAWE), ONG Casa Venezuela,

 Observatório do Petróleo e Gás (OPG),

 Organización de Pueblos Indígenas del Oriente (ORPIO),

Pachamama Alliance Perú, Projeto Saúde e Alegria,

Purpose Brasil,

Reacción Climática,

 Rede Brasileira de Educação Ambiental (REBEA),

Red de Transición Energética,

 Rede de Cooperação Amazônica (RCA),

Rede de Mulheres Ambientalistas da América Latina,

 Rede Fé, Paz e Clima, SOA HUB Garopaba,

Sociedad Amigos del Viento Uruguay,

Uma Gota No Oceano,

Unión de Afectados por Texaco,

UDAPT,

 Universidade Federal do Ceará.,

350 América Latina

Oitenta organizações enviam ofício ao governo para brecar a exploração de petróleo na foz do Amazonas

Oitenta organizações enviam ofício ao governo para brecar a exploração de petróleo na foz do Amazonas

O Ibama precisa solucionar questionamentos ambientais e sociais, buscando segurança técnica e jurídica, antes de avaliar a licença para o bloco FZA-M-59

Originalmente publicado em Observatório do Clima

Brasília, 12 de abril de 2023 – Representantes de 80 organizações da sociedade civil alertaram nesta quarta-feira ministérios e órgãos do governo federal para que não seja emitida licença de extração de petróleo e gás na foz do Amazonas enquanto não for realizada uma avaliação ambiental estratégica para toda a região e se adotarem as medidas necessárias previstas na legislação.

Segundo entendimento das organizações da sociedade civil que subscrevem o ofício entregue ao Ministério das Minas e Energia, esse bloco é a porta de entrada de um projeto mais amplo, que pretende expandir a exploração e produção de petróleo e gás natural em toda a Margem Equatorial Brasileira. “A abertura dessa nova fronteira exploratória é uma ameaça a esses ecossistemas e, também, é incoerente com os compromissos assumidos pelo governo brasileiro perante a população brasileira e a comunidade global.” O documento reforça ainda o pedido para que sejam adotadas as medidas necessárias para a transição energética justa e inclusiva no Brasil.

O ofício traz o histórico da tentativa de licenciamento do bloco FZA-M-59, iniciado em 2014, quando a concessão da área era liderada pela britânica BP em parceria com a Petrobras. Em 2021, a BP desistiu do negócio e a companhia brasileira assumiu 100% da concessão. Para que a exploração seja considerada, as organizações apontam os seguintes requisitos:

Elaboração da Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) para a bacia da Foz do Amazonas, pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima e Ministério de Minas e Energia, com a efetiva análise sobre a compatibilidade da instalação da indústria petrolífera na região. Devem ser considerados os impactos cumulativos e sinérgicos de toda a cadeia produtiva sobre fatores ambientais e socioeconômicos e, também, o conjunto de blocos previstos pela ANP para a região, além de se garantir a transparência e ampla participação da sociedade.

    • Realização da consulta livre, prévia e informada dos povos e comunidades indígenas e tradicionais no Pará e Amapá, seguindo as diretrizes da Convenção OIT nº 169. Esse processo visa dar acesso à informação e participação sobre os impactos e riscos da instalação da indústria de petróleo na região, com a possível identificação de impactos ambientais e socioeconômicos ainda não avaliados e mitigados, notadamente os cumulativos, considerando o conjunto de blocos previstos pela ANP para a região.

 

    • Conclusão do estudo sobre a Base Hidrodinâmica da Margem Equatorial e a incorporação de seus resultados no estudo de modelagem de dispersão de óleo do bloco FZA-M-59.

 

    • Demonstração da eficácia das ações de resposta transfronteiriça previstas no Plano de Emergência Individual em caso de acidentes com vazamento de óleo, considerando a necessidade de se comprovar a continuidade, de imediato, das ações de resposta em águas jurisdicionais da Guiana Francesa, por meio de documentos com esse conteúdo firmados com as autoridades locais e da França.

 

Em suma, o pleito é de que não seja emitida licença de operação para nenhum bloco na bacia sedimentar da foz do Amazonas “enquanto não houver plena segurança técnica e jurídica para a tomada de decisão informada e precaucionária do órgão licenciador”.

Sobre a foz do Amazonas: A região da Costa Amazônica é um território estratégico para a conservação da biodiversidade, abrigando 80% da cobertura de manguezais do Brasil. De importância ímpar e reconhecimento internacional, essa região agrega ecossistemas únicos no mundo, que coevoluem, formando, assim, o estuário amazônico, ambiente rico em manguezais, ambientes recifais, economias e culturas locais. O rio Amazonas, elemento central desse sistema, representa o maior aporte de água continental no oceano e a maior descarga de sedimentos em suspensão, despejando anualmente 17% do total mundial. Toda essa pluma de sedimentos é considerada uma das maiores riquezas em nutrientes, abastecendo até áreas do Caribe e ainda considerada como um ecossistema de “carbono azul”, ou seja, que podem contribuir com o desejável balanço de CO₂.

O setor petrolífero avalia essa região como a fronteira exploratória no Brasil com maior volume potencial de reservas, podendo atingir 14 bilhões de barris de petróleo. A sua exploração, além de afetar o ecossistema, contribui com as mudanças climáticas, aumentando as emissões de gases de efeito estufa e outros poluentes, desviando investimentos de fontes renováveis de energia para campos de petróleo que, possivelmente, deverão ser desativados com o aumento dos preços de carbono e dos compromissos climáticos.

Informações para imprensa
Solange A. Barreira – Observatório do Clima
solange@pbcomunica.com.br  
+ 55 11 9 8108-7272

 

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O petróleo não pode ser deles

O petróleo não pode ser deles

Petrobras quer explorar foz do Amazonas mesmo sem uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar que verifique se a área está apta

Originalmente publicado em Observatório do Clima

A Margem Equatorial, uma área que engloba o litoral do Amapá, no extremo norte do Brasil, ao Rio Grande do Norte, no nordeste, tem atiçado a ambição de petrolíferas. A foz do rio Amazonas faz parte desse grupo de bacias marítimas – que também inclui as bacias de Pará-Maranhão, Barreirinhas, Ceará e Potiguar – e abriga o bloco 59, um dos que recebeu em 2013 a concessão da Agência Nacional do Petróleo (ANP) para a exploração de recursos fósseis. O bloco está localizado na costa da cidade de Oiapoque (AP) e tem uma área de 766 km², quase o tamanho de Campinas (SP). O Ibama está analisando os estudos e dados técnicos que são requeridos no licenciamento ambiental, sendo que o bloco 59, controlado pela Petrobras, é o que está com o processo mais adiantado. O poder público, no entanto, ainda não fez uma Avaliação Ambiental de Área Sedimentar (AAAS) na região, algo que deveria ter sido realizado antes mesmo de os blocos serem ofertados em leilões.

A AAAS foi instituída em 2012, um ano antes da concessão de blocos da Margem Equatorial, pela Portaria Interministerial MME-MMA nº 198/2012. Trata-se de um tipo de avaliação de impacto usada em diversos países para averiguar se áreas de determinada bacia sedimentar estão aptas para a exploração de petróleo e gás natural. Ela também estabelece recomendações a serem integradas ao processo de outorga dos blocos exploratórios e aos licenciamentos ambientais posteriores,

A conclusão de uma AAAS classifica as áreas sedimentares em três categorias: aptas, não aptas e em moratória. A primeira indica que foram averiguadas condições e características socioambientais compatíveis com a exploração e produção de petróleo e gás natural. A segunda classificação diz respeito a áreas onde foram identificados elementos ambientais relevantes que necessitam de grande conservação e devem ser resguardados dos impactos e riscos associados às atividades petrolíferas. Logo, são áreas que não devem ser exploradas. Por fim, são postos em moratória aqueles trechos que necessitam de estudos aprofundados e desenvolvimento tecnológico de alternativas ambientalmente adequadas antes que se decida se podem ou não ser explorados (o vídeo abaixo explica o que é uma AAAS em detalhes).

 

No Brasil, até o momento, foram feitas apenas duas AAAS: uma das bacias marinhas Sergipe-Alagoas e Jacuípe e uma da bacia terrestre do Solimões, localizada no Amazonas. O estudo da bacia marinha indicou 76% da área como apta e 24% como não apta. Já o estudo da bacia terrestre mostrou que 27,8% está apta para exploração, 57,9% foi classificada como não apta e 3,6% ficou em moratória. O restante (10,7%) corresponde a áreas já concedidas. As duas avaliações foram concluídas em 2020. O fato de a ANP ter planejado sete rodadas de concessão de blocos exploratórios desde 2013 em diversas regiões sem a AAAS mostra o quanto o país está atrasado no cumprimento da legislação.

Conforme explicam Luís Enrique Sánchez, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP), e a engenheira ambiental Juliana Siqueira-Gay em um estudo de 2021 elaborado para o Observatório do Clima, as decisões sobre ofertas de blocos em leilões têm sido amparadas não por AAAS, mas por uma manifestação conjunta com foco em questões ambientais feita por dois ministérios, o de Meio Ambiente e Mudança do Clima e o das Minas e Energia. Esse procedimento é mais rápido, mas está longe de ter a profundidade técnica de uma AAAS.

A pesquisa ainda lembra que a oferta de blocos sem uma sistemática avaliação ambiental prévia põe em risco as próprias empresas licitantes, “que poderão ter maior dificuldade para licenciamento ambiental ou financiamento de projetos em áreas sensíveis”. É o que vem ocorrendo na foz do Amazonas.

Um Parecer Técnico de 2013 feito pelo Ibama mostrou na conclusão que a bacia da foz do Amazonas necessitava de estudos detalhados por causa da “extremamente alta relevância biológica” e possíveis impactos na atividade pesqueira. Ressaltou que um eventual derramamento de óleo na área pode atingir restingas e manguezais – uma das maiores áreas de manguezais da costa brasileira está no Amapá -, além de águas internacionais, como o mar da Guiana Francesa. Mesmo assim, considerou 65 blocos aptos para a 11ª Rodada de Licitações da ANP.

Os impactos da exploração da área não estão restritos a vazamentos, como lembram Sánchez e Gay. “Impactos significativos podem resultar da condução normal de atividades como lançamento de cascalho de perfuração sobre fundos marinhos”, citam.

Apesar de a AAAS ser indicada para antes de leilões, ela ainda pode ser realizada na foz do Amazonas, mesmo o leilão tendo ocorrido. “A foz do Amazonas tem uma grande sensibilidade ambiental, é uma região com alta biodiversidade, que ainda precisa ser estudada”, diz Suely Araújo, especialista sênior em políticas públicas do Observatório do Clima. “É inaceitável pressupor que toda a região possa ser objeto de exploração de petróleo, sem um olhar integrado para os efeitos negativos do ponto de vista socioambiental. A análise de um empreendimento específico no âmbito do licenciamento não supre a avaliação que necessita ser realizada.” .

Um dos pontos destacados por pesquisadores sobre a biodiversidade da região está relacionado a formações de recifes que precisam ser mais estudados. Um artigo publicado na Nature em 2019 atesta que há organismos vivos nessas estruturas que vão do Amapá até o Maranhão, numa extensão de 1.350 km. Uma exploração de petróleo pode por esses organismos – algas, coralinas e esponjas, entre outros – em risco. Em agosto, haverá uma expedição científica para obter mais informações sobre a biodiversidade.

“O ideal seria suspender todos os pedidos de licenciamento, não apenas o do bloco 59, até que uma AAAS seja feita na região”, diz Suely Araújo. O professor e oceanógrafo Nils Asp, da Universidade Federal do Pará (UFPA), concorda: “A região da margem equatorial da bacia da foz do Amazonas é muito complexa. São centenas de metros, às vezes quilômetros de sedimentos acumulados com alto teor de matéria orgânica que implica em gases que levam a riscos geológicos.” O professor explica que o bloco 59 tem um trecho com alta declividade, o chamado talude, que deve ser analisado com cautela por causa do risco do movimento de terra e de sedimentos, o que pode causar acidentes durante os trabalhos. O talude da foz pode alcançar mais de 3 mil metros de profundidade.

“A própria operação de perfuração se torna mais perigosa por causa disso. Porque durante a perfuração pode ocorrer esse tipo de deslizamento. Enfim, aumenta o risco da operação em si e o risco de vazamento”, completa. Nils acredita que se houvesse uma AAAS, a área do bloco 59 poderia ser classificada como “em moratória” para a realização de mais estudos.

Um parecer técnico do Ibama no processo de licenciamento do bloco 59, atualizado em 24 de janeiro de 2023, afirma que “em áreas de notória sensibilidade socioambiental e de nova fronteira para a indústria do petróleo, a aplicação da AAAS e outros instrumentos de gestão ambiental previamente ao licenciamento da atividade de perfuração exploratória são prioritários e essenciais para a compreensão da adequabilidade da cadeia produtiva da indústria petrolífera em determinada região”.

Ao Observatório do Clima, a Petrobras disse que se coloca à disposição dos órgãos de governo para colaborar em uma possível AAAS. A empresa também disse que a perfuração de poço exploratório para verificar a existência ou não de jazida de petróleo e gás está prevista para ocorrer no Amapá, a 175 km da costa e a uma profundidade de 2.880 m. “Será um trabalho temporário, com duração prevista de cerca de cinco meses”, argumentou a empresa.

A foz do Amazonas e o Bloco 59 (Fonte: Estudo de Impacto Ambiental)

A foz do Amazonas e o Bloco 59 (Fonte: Estudo de Impacto Ambiental)

 

Processo se arrasta desde 2014

Em agosto de 2013, a BP Energy do Brasil e a Petrobras firmaram contrato de concessão com a ANP para a exploração e produção de petróleo e gás natural no bloco 59. No ano seguinte, a BP Energy iniciou o pedido de licenciamento ambiental para ter o direito de procurar recursos fósseis no bloco. A empresa transferiu a exploração completa da área para a Petrobras em 2020. Desde então, a brasileira está à frente do processo de licenciamento, que ainda consta como em fase inicial no sistema do Ibama.

Os problemas relacionados a informações existem desde que o licenciamento começou. Em 2015, por exemplo, o Ibama suspendeu o prazo de análise do requerimento da Licença de Operação por ter considerado que o Estudo de Impacto Ambiental (EIA) apresentado pela BP Energy estava incompleto e precisava de justificativa para a “não incorporação de programas sugeridos no termo de referência”. A complementação foi entregue meses depois. Já a primeira versão do Relatório de Impacto Ambiental (Rima) foi apresentada somente em 2017 e também precisou de complementações.

O Plano de Emergência Individual (PEI), que faz parte do EIA e é fundamental para a avaliação da viabilidade, teve a primeira versão apresentada também em 2017, mas contava com falhas. Um problema era que a modelagem de dispersão de óleo levou em consideração um trabalho feito em 2015. Segundo especialistas, a modelagem continha deficiências por não considerar a complexidade da morfologia costeira amazônica e da hidrodinâmica local, como ondas, marés, fluxo de correntes e intensidade de ventos.

O vai e vem de pedidos permanece até hoje. Na segunda-feira (20), o Ibama solicitou esclarecimentos adicionais relativos ao Plano de Proteção à Fauna, o que frustrou os planos da empresa de fazer o simulado de emergência, ação para averiguar como ela deve proceder em caso de vazamentos na região. Quando realizar a simulação, a empresa dará mais um passo rumo à aprovação do licenciamento ambiental.

Uma manifestação enviada em 2021 ao Ministério Público pelo Observatório do Clima e outras instituições já havia exposto que o histórico do processo de licenciamento não havia demonstrado a viabilidade ambiental da atividade de perfuração marítima de poços no bloco 59. Assim, recomendava o arquivamento do processo.

Em entrevista publicada no site Sumaúma na segunda-feira (20), Rodrigo Agostinho, presidente do Ibama, afirmou que a autarquia está avaliando todas as considerações feitas pela equipe técnica, pelo Ministério Público e pela sociedade civil. Ressaltou que o tema é sensível e que nenhuma decisão será tomada às pressas.

A Petrobras, por outro lado, segue ansiosa. No início de março, a empresa assinou um memorando com a petrolífera Shell para futuras parcerias relacionadas à exploração de recursos fósseis, inclusive na Margem Equatorial. Para Suely Araújo, do Observatório do Clima, a posição da Petrobras é contraditória: propagandeia uma vontade de investir na transição energética mas, ao mesmo tempo, pretende expandir a exploração de petróleo para novas fronteiras, incluindo regiões ambientalmente frágeis como a foz do Amazonas. A especialista sênior em políticas públicas foi presidente do Ibama de 2016 a 2018 e barrou um pedido de licenciamento de cinco blocos da empresa Total na foz, próximos ao bloco 59. Hoje, esses blocos estão sob controle da Petrobras, que tenta novamente licenciá-los.

Daniela Jerez, analista de políticas públicas na WWF Brasil, acompanha o processo de licenciamento e acredita que liberá-lo é dar alguns passos para trás, principalmente em um momento no qual é preciso reduzir o uso de combustíveis fósseis para conter a emergência climática, que já mostrou não ter vindo para brincadeira. O relatório síntese do IPCC (sigla em inglês para Painel Intergovernamental sobre Mudança Climática, da ONU) divulgado na segunda-feira (20) apontou que as emissões de gases de efeito estufa precisam diminuir 43% até 2030.

Mesmo que se encontre petróleo na foz, a exploração só vai começar daqui alguns anos. Suely Araújo e Daniela Jerez questionam o que vai representar o petróleo quando blocos na região chegarem à fase de produção, visto que a sociedade não pode continuar consumindo combustíveis fósseis da forma que faz hoje por causa da emergência climática. “A nossa expectativa é que o governo tome uma decisão pensando não apenas nesse licenciamento específico, mas pensando numa transição energética justa olhando para o futuro do Brasil, que tem potencialidades em outras fontes de energia que não a exploração de petróleo”, diz Daniela Jerez. (PRISCILA PACHECO)