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COP26: Arayara vai à justiça para garantir recuperação social e ambiental do desastre causado pelas usinas Jorge Lacerda em Santa Catarina

COP26: Arayara vai à justiça para garantir recuperação social e ambiental do desastre causado pelas usinas Jorge Lacerda em Santa Catarina

São necessários R$ 5 bilhões para treinar trabalhadores , recuperar o ambiente destruído e preparar a região para aproveitar a economia não poluente da economia verde; governador do RS participou de debate hoje na COP26 e se comprometeu a superar projeto da Mina Guaíba, que ameaça a água potável de 5 milhões de habitantes da região metropolitana de Porto Alegre

O Instituto Internacional Arayara vai à justiça para exigir que as empresas Engie, Fram Capital e Diamante Brasil assumam os passivos e treinem 20 mil trabalhadores para a transição energética da cadeia produtiva do carvão, que envolve o Complexo Termoelétrico de Jorge Lacerda, instalado em Santa Catarina (SC), e as minas de carvão que abastecem as usinas. As Ações Civis Públicas (ACP) instauradas até hoje pelo Ministério Público Federal (MPF) com finalidades semelhantes chegam a R$ 1,5 bilhão.

Segundo o Instituto Arayara  – que desde março vem realizando estudos com amostras do solo, do ar e coletando depoimentos de especialistas e de pessoas atingidas pelas atividades das usinas e das minas (uma população total de quase 1 milhão de pessoas) -, os custos globais da recuperação social, econômica e ambiental do assim denominada “território Jorge Lacerda”, que se estende por uma área 12 vezes maior do que a região metropolitana de Paris, podem atingir mais R$ 5 bilhões.

As informações foram dadas hoje (4 de novembro), de manhã, pela advogada Nicole Figueiredo de Oliveira, diretora do Instituto Arayara e do Observatório do Carvão Mineral, no  debate “O carvão e os desafios da Transição Justa no Sul do Brasil”. O evento foi realizado  durante da COP26, a conferência da ONU que ocorre em Glasgow, na Escócia, para debater  as mudanças climáticas do planeta e a Convenção do Clima, assinada por centenas de países, inclusive o Brasil.

Em meados de 2021, a Engie vendeu por quase R$ 320 milhões as usinas às empresas Fram Capital e Diamante Energia, que não têm experiência na área de geração de termoeletricidade movida a carvão. 

Segundo a diretora do Instituto Arayara, a venda de Jorge Lacerda não isenta os antigos e os novos proprietários das usinas dos passivos gerados ao longo das décadas de funcionamento da cadeia produtiva do carvão no estado catarinense.

As informações completas a respeito do caso Jorge Lacerda e as alternativas que o Instituto Arayara vem propondo para treinar os trabalhadores e superar a dependência econômica do carvão mineral estão no relatório técnico “O legado tóxico da Engie-Diamante-Fram Capital no Brasil: Mapa da Contaminação e Destruição Geradas pelo Complexo Termelétrico Jorge Lacerda e pelas Minas de Carvão que o Abastecem”.

O documento pode ser baixado no endereço www.coalwatch.org.

Durante o debate, foi exibido um mini-documentário, produzido pelo Instituto Arayara, que resume o relatório, e que pode ser assistido aqui.

Ao fim do evento, o presidente do Instituto Internacional Arayara, Juliano Bueno, enviou através do Instagram a seguinte mensagem sobre a repercussão da denúncia.

Também participou do debate o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), que assumiu o compromisso de avançar nas discussões sobre a transição justa da economia do carvão em direção ao que ele chamou de “hidrogênio verde”.

A participação de Eduardo Leite pode ser acompanhada aqui. 

Leite se comprometeu a revisar o caso da Mina Guaíba, projeto da maior mina de carvão mineral a céu aberto na América Latina, que seria desenvolvido na região metropolitana da capital gaúcha Porto Alegre (RS), ameaçando o fornecimento de água potável da capital gaúcha, mas que foi suspenso pela ACP protocolada em 2020 pelo Instituto Arayara.

Outros participantes do evento realizado nesta manhã foram o físico Roberto Kishinami (diretor do Instituo Clima e Sociedade e um dos maiores especialistas em energia do Brasil); o engenheiro Ricardo Baitelo (do Instituto Energia e Meio Ambiente, que criticou a opção do governo brasileiro de aumentar nos próximos anos a geração de energia a partir de termelétricas movidas a carvão e a gás natural); e o professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Emílio La Róvere, que afirmou ser possível usar os subsídios concedidos à Jorge Lacerda para financiar a geração de energia não poluente, treinar os trabalhadores da termelétrica e recuperar as áreas destruídas em SC pela cadeia produtiva do carvão).

Contato em Glasgow

Nicole Figueiredo Oliveira (nicole@arayara.org)

Assessoria de imprensa no Brasil

Carlos Tautz (Celular e WhatsApp 21-99658-8835 e e-mail carlos.tautz@arayara.org)

#BrazilClimateHub #brazilclimateactionhub #COPCOLLAB26 #COP26= #Arayara #ObsdoCarvão #EmDefesadaVida #TransiçãoJusta #JustTransition #ToxicEngie #EngieToxicLegacy #coalwatch

Crianças indígenas são ‘sugadas’ por balsa do garimpo em Roraima; uma morreu e outra segue desaparecida

Crianças indígenas são ‘sugadas’ por balsa do garimpo em Roraima; uma morreu e outra segue desaparecida

A Hutukara Associação Yanomami denunciou, por meio de nota divulgada nesta quarta-feira (13), uma tragédia anunciada: duas crianças indígenas da Terra Yanomami, na comunidade Makuxi Yano, em Roraima, foram vítimas da atuação do garimpo ilegal no rio Parima. Uma delas, de 5 anos, morreu e seu corpo foi encontrado nesta quarta. A outra, de 7 anos, segue desaparecida.

Segundo o relato dos indígenas recebido pela associação, as crianças estavam brincando no rio, na terça-feira (12), próximas a uma balsa do garimpo ilegal “quando foram sugadas e cuspidas para o meio do rio e levadas pela correnteza”.

A Fundação Nacional do Índio (Funai) foi acionada pela associação Yanomami mas, até a publicação desta matéria, não havia se pronunciado sobre o caso.

Também acionado, o Conselho de Saúde Indígena Yanomami e Ye’kuana (Condisi-YY) enviou um ofício ao Corpo de Bombeiros, que também trabalhará nas buscas da criança indígena desaparecida com aeronaves e mergulhadores.

“A morte de duas crianças Yanomami é mais um triste resultado da presença ilegal do garimpo na Terra Indígena Yanomami, que segue invadida por mais de 20 mil garimpeiros. Até setembro de 2021, a área de floresta destruída pelo garimpo ilegal superou a marca de 3 mil hectares – um aumento de 44% em relação a dezembro de 2020”, diz nota assinada Dário Kopenawa Yanomami, vice-presidente da Hutukara Associação Yanomami.

Confira abaixo a íntegra.

Fonte: https://revistaforum.com.br/brasil/criancas-indigenas-sao-sugadas-por-balsa-do-garimpo-em-roraima-uma-morreu-e-outra-segue-desaparecida/#

A mineração em terra indígena com nome, sobrenome e CNPJ

Levantamento exclusivo revela explosão de processos desde 2019 e lista os beneficiários com mais pedidos minerários em TIs: políticos, cooperativas de garimpo e até um artista plástico paulista

Por Agência Pública

A intenção de Jair Bolsonaro em abrir as Terras Indígenas brasileiras para a exploração do subsolo e recursos hídricos não é novidade. Desde que assumiu a Presidência, o mandatário deixou claro, em diferentes momentos, seu desejo nesse sentido.

Uma das justificativas apresentadas é de que as terras indígenas devem ser aproveitadas economicamente. Mas, além de contrariar a Constituição de 1988, como afirmou em entrevista à Agência Pública o subprocurador-geral da República, Antônio Carlos Bigonha, o conteúdo do PL 191/2020 também tem sido questionado por entidades indígenas, organizações socioambientais e pesquisas de opinião – Rodrigo Maia, presidente da Câmara dos Deputados, garantiu na quarta-feira (18) que não vai pautar o projeto na Câmara.

Mas, afinal, quem são os potenciais beneficiados com a mineração em terras indígenas?

Levantamento inédito realizado pela Pública com base em dados da Funai e da Agência Nacional de Mineração (ANM) não só traz nome, sobrenome e CNPJ de pessoas físicas e jurídicas com mais pedidos minerários em Terras Indígenas (TIs) como revela um aumento de processos de pesquisa mineral nessas áreas em 2019, revertendo uma tendência de queda dos últimos anos.

Os dados indicam que os processos de exploração minerária em TIs da Amazônia cresceram 91% desde o início do governo Bolsonaro. Esta foi a primeira vez, desde 2013, que os requerimentos registraram aumento – antes, eles vinham caindo ano após ano.

Entre os potenciais beneficiários da medida do Executivo, estão grandes figuras políticas do Amazonas, cooperativas de garimpo com sócios envolvidos em denúncias por crimes ambientais, uma gigante da mineração mundial e até mesmo um artista plástico paulista.

Os dados listados pela Pública apresentam dois cenários – requerimentos incidentes em TIs feitos no período 2011-2020 e os registrados durante o governo Bolsonaro (2019-2020).

Sawré Muybu, dos Munduruku, a mais afetada na década

É no Pará onde está a maioria dos processos minerários em terras indígenas que avançaram no primeiro ano de Bolsonaro. A Terra Indígena Kayapó é a que mais enfrenta processos sobre suas terras no período. Em seguida, está a terra Sawré Muybu, dos Munduruku, também no Pará.

A Sawré é justamente o território indígena mais afetado por processos minerários na década: mais de 14% de todos os requerimentos que passaram por áreas indígenas na Amazônia afetam a terra. Foram 97 processos visando sobretudo a jazidas de ouro, cobre e diamante, e, em menor quantidade, de cassiterita e extração de cascalho.

Após o Pará, são os estados do Mato Grosso e Roraima que mais concentram processos em terras indígenas durante o primeiro ano de Governo Bolsonaro.

A ANM registrou processos minerários – e chegou a conceder títulos de mineração – até mesmo em TIs homologadas, isto é, que já passaram por todas as etapas de regularização junto ao governo federal, incluindo a sanção presidencial. Um dos territórios potencialmente afetados pelos títulos minerários é o do povo Uru-Eu-Wau-Wau, em Rondônia, cujo processo de homologação foi concluído em 2006. No território vivem nove povos, incluindo indígenas isolados.

Em 2013, por exemplo, a Cooperativa Mineradora dos Garimpeiros de Ariquemes (Coomiga) obteve um título de lavra garimpeira de ouro que incide em parte do território indígena dos Uru-Eu-Wau-Wau. A cooperativa é a terceira maior produtora de estanho do país, segundo o Anuário Mineral de 2018 da ANM. Já em 2016, foi a Cooperativa Estanífera de Rondônia que conseguiu um título para lavrar cassiterita em uma área que inclui trechos da terra dos Uru-Eu-Wau-Wau. A cassiterita é o principal minério de estanho utilizado para produzir ligas metálicas – e fica em Rondônia, no município de Ariquemes, o maior garimpo de cassiterita a céu aberto do mundo.

Nos últimos dez anos, a ANM registrou 656 processos minerários que passaram por trechos de territórios indígenas. Além dos Munduruku, no Pará, os processos minerários nesta década se concentraram nas terras dos Kaxuyana e dos Kayapó, ambos no Pará, e dos Yanomami, em Roraima e no Amazonas.

Cooperativa tem 26 requerimentos em TIs e parte dos sócios foi denunciada pelo MPF

A Cooperativa dos Garimpeiros da Amazônia (Coogam) ocupa o terceiro lugar no ranking de requisições de exploração mineral em terras indígenas no período analisado (2011-2020). Fundada nos anos 1990, ela reúne mais de uma centena de garimpeiros e atua nos estados de Rondônia, Amazonas e Pará, no garimpo feito por meio de balsas.

Foram encontrados 26 requerimentos de lavra garimpeira incidentes em nove terras indígenas na Amazônia Legal.

Para além das requisições formais feitas à ANM, alguns quadros ligados à organização enfrentam acusações na Justiça Federal de exploração mineral ilegal em terras indígenas. É o caso, por exemplo, do atual presidente da cooperativa, Cacildo Jacoby, denunciado pelo Ministério Público Federal (MPF) por formação de quadrilha, usurpação dos bens da União e poluição e extração de bens minerais sem autorização do órgão competente.

A denúncia do MPF apoia-se na Operação Eldorado, deflagrada pela Polícia Federal (PF) em novembro de 2012. A operação visou, nos termos da própria PF, desarticular uma “organização criminosa dedicada à extração ilegal de ouro” nas terras indígenas Kayabi e Munduruku e de outros garimpos ilegais no leito do rio Teles Pires. Além de Jacoby, o fundador da Coogam, Geomário Leitão Sena, também é réu pelas mesmas acusações na ação penal que corre na Justiça Federal do Mato Grosso.

A investigação da PF constatou que o ouro extraído ilegalmente no leito do Teles Pires era entregue a empresas Distribuidoras de Títulos de Valores Mobiliários (DTVMs) e, após disfarçada a sua origem, era vendido como ativo financeiro a empresas em São Paulo. Só uma das DTVMs denunciadas pela PF movimentou cerca de R$ 150 milhões. Procurada, a Coogam não respondeu aos questionamentos da Pública enviados por email até o fechamento da reportagem.

Ex-governador e vice do estado do Amazonas possuem seis requerimentos em TIs

Duas figuras da política do Amazonas estão entre os sócios da terceira empresa que mais registrou requerimentos de exploração mineral em terras indígenas durante o primeiro ano do governo Bolsonaro.

A SMD Recursos Naturais Ltda., criada em 2012 e com sede em São Paulo, conta com o ex-governador do estado Amazonino Armando Mendes e seu antigo vice e ex-secretário da Fazenda Samuel Assayag Hanan entre o quadro de sócios. Hanan possui um longo histórico ligado à mineração: entre outras passagens profissionais, já foi presidente da Paranapanema S.A., uma gigante da produção de cobre no país, atuou no setor de Minerocobre Metalúrgico da British Petroleum, foi diretor industrial e comercial da Companhia Estanífera do Brasil (Cesbra) e fez parte do Conselho Superior de Minas do Ministério de Minas e Energia.

Os requerimentos da SMD visam à pesquisa de estanho e incidem sobre as TIs Yanomami, em Roraima, e Waimiri-Atroari, entre este estado e o Amazonas.

Como governador, Amazonino tomou decisões que favoreceram outros interessados na exploração mineral em terras indígenas. Em dezembro de 2017, o então governador renovou Licenças de Operação Ambiental (Loas) em poder da Coogam – outra pessoa jurídica que aparece no levantamento da Pública –, além de conceder outra licença de exploração de ouro para a organização. As Loas, expedidas pelo órgão ambiental do Amazonas, o Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), autorizaram a Coogam a explorar ouro em cerca de 87 mil hectares no leito do rio Madeira. Dias depois da concessão, o Ministério Público Federal (MPF) ajuizou uma ação contra o Ipaam pedindo a suspensão de uma das licenças. Segundo o MPF, a licença foi concedida “sem exigência prévia de estudos ambientais adequados e a despeito de a atividade atingir terras indígenas, unidades de conservação federais e de produzir impacto sobre curso d’água federal em mais de um Estado da Federação”.

As licenças foram concedidas antes da conclusão de um estudo do Conselho Estadual do Meio Ambiente do Amazonas (Cemaam) sobre resíduos de mercúrio no rio Madeira. Elas foram suspensas liminarmente pela Justiça Federal dias depois da concessão. Quando as suspendeu, a juíza Maria Elisa Andrade apontou uma série de descumprimentos de condicionantes ambientais ligadas às licenças de operação. “O acervo documental dos autos demonstra o sistemático descumprimento de condicionantes de licenças ambientais, a provocar danos que colocam em risco a integridade do Rio Madeira, bem como riscos à saúde humana, à biodiversidade e à manutenção do ecossistema amazônico”, escreveu a magistrada em sua decisão. O caso segue em trâmite na Justiça Federal do Amazonas.

Cooperativa com interesse em TIs tem dois sócios denunciados por crimes ambientais

A Cooperativa de Trabalho de Mineradores e Garimpeiros do Marupá (Coopermigama), detentora de quatro requerimentos em TIs em 2019, é outra a ter sócios envolvidos em questões judiciais na área de Meio Ambiente.

Em 2015, Alex Renato Queiroz Carvalho, um dos 12 sócios da cooperativa, foi investigado pela Polícia Civil do Pará por envolvimento em fraudes na aquisição de créditos florestais junto à Secretaria de Estado de Meio Ambiente e Sustentabilidade (Semas) do estado. No inquérito, Queiroz Carvalho é descrito como um dos “intermediários compradores de madeira, créditos e empresas”.

Segundo a investigação, a fraude ocorreu em fevereiro de 2015 e envolveu a Madeireira Sagrada Família, de Pacajá, no Pará – na época ela era de propriedade do então secretário de Desenvolvimento Econômico do município, João Paulo Chopek.

Queiroz Carvalho chegou a ser preso em julho de 2015 por estar supostamente envolvido em transferência irregular de madeira, na comercialização de empresas fantasmas, comercialização de créditos de produtos florestais, crimes ambientais e lavagem de capitais. Foi solto pela Justiça paraense no mesmo mês, mas ainda responde ao processo em liberdade. Procurado pela Pública, o advogado de Queiroz Carvalho respondeu que ele “atuava como comprador de uma empresa exportadora, tendo sido equivocadamente apontado como proprietário de uma empresa madeireira que teria recebido uma carga de madeira irregular, a qual o legítimo proprietário compareceu em juízo e assumiu a responsabilidade sobre o empreendimento”. A advogado afirmou ainda que o processo criminal se encontra em fase de diligências e que “a defesa tem plena convicção da futura absolvição” do acusado.

Outro sócio, Cleidson Cavalcante Hashiguchi, é réu em dois processos na Justiça Federal. No primeiro, foi autuado pelo ICMBio por praticar garimpo sem autorização no rio Jamanxim, em área no entorno da Flona Itaituba II, em Trairão, no Pará. Foi denunciado pelo MPF e condenado em primeira instância, na 1ª Vara de Itaituba, em junho de 2019, mas recorreu. O MPF apresentou contrarrazões ao recurso e o processo agora corre em segunda instância. Cleidson também foi denunciado junto com outras seis pessoas por atividade de extração ilegal de ouro na Estação Ecológica Juami-Japurá em Tefé, no Amazonas. Nem Cleidson, nem sua defesa se pronunciaram até a publicação.

Artista plástico lidera pedidos em 2019; a gigante Anglo também aparece com destaque

O campeão de requisições de exploração mineral em terras indígenas durante o governo Bolsonaro é o arquiteto e artista plástico Sami Hassan Akl. Ele fez sete pedidos para exploração mineral de diamante em TIs apenas em 2019. Ele é sócio da empresa Bogari & Akl Comércio Importação e Exportação Ltda., sediada em São Paulo, voltada ao mercado artístico. Procurado pela Pública, uma pessoa que se identificou como assistente de Sami Akl informou que ele estava em viagem ao exterior e por isso não pôde responder. Indicou o número de um geólogo que estaria auxiliando o artista plástico nos pedidos de mineração, mas não conseguimos contato com o profissional.

Outra a aparecer com destaque no levantamento de requerimentos de exploração mineral é a gigante da mineração mundial, a Anglo American, sediada em Londres. Uma de suas subsidiárias, a Anglo American Níquel do Brasil, a maior produtora de níquel do país, aparece com destaque nos dois recortes do levantamento. A empresa fez seis requerimentos de exploração em terras indígenas em 2019. Ao longo desta década, são 46 requerimentos incidentes em TIs.

O grupo Anglo também enfrenta ações na Justiça relacionadas a infrações ambientais no Brasil. O braço de minério de ferro da companhia é alvo de ação civil pública pelo Ministério Público de Minas Gerais devido ao rompimento de um mineroduto no município de Santo Antônio do Gama, em Minas Gerais. O MP estadual de Minas também cobra R$ 400 milhões na Justiça como reparação de danos morais e sociais coletivos às comunidades impactadas pelo Mineroduto Minas-Rio – um caso já abordado por nossa reportagem. Em âmbito federal, o MPF mineiro pede a suspensão das licenças de operação já concedidas à Anglo bem como do licenciamento ambiental do projeto Minas-Rio.

Procurada, a Anglo afirmou que “apresentou sua defesa nas ações judiciais e não comenta o seu conteúdo” e sobre os requerimentos disse que os fez “com base em dados geológicos disponíveis”, que “a autorização para realizar esses trabalhos de pesquisa mineral será concedida ou não pelas autoridades competentes” e que “somente executa trabalhos de pesquisa mineral em áreas devidamente autorizadas”. A empresa disse ainda, em nota, que “realizou uma revisão de seu portfólio e desistiu de todos os requerimentos em áreas de pesquisa em terras indígenas até 2015. Requerimentos de pesquisa vigentes que porventura margeiem terras indígenas podem apresentar blocos com interferências nesses territórios. Nesses casos, cabe à Agência Nacional de Mineração (ANM) demarcar corretamente os blocos fora das áreas ou reservas indígenas.”

Processos “Branca de Neve”

“Normalmente, quando algum processo minerário incide em terra indígena, ele tem tido sua tramitação sustada. É um fenômeno burocrático curioso: os requerimentos não são indeferidos, mas também não tramitam, ficam, como chamamos, de ‘processos Branca de Neve’, dormindo à espera do beijo do príncipe. A ANM (Agência Nacional de Mineração) mantém alguns títulos nessa situação, há casos de títulos concedidos antes da homologação de terras indígenas ou antes da Constituição de 1988. Há questionamentos em juízo sobre esses títulos”, explica o sócio-fundador do Instituto Socioambiental (ISA) Márcio Santilli.

De acordo com manifestação da ANM ao MPF do Pará, a agência considera que a falta de lei regulamentadora não impede que os processos minerários sejam sobrestados, ou seja, abertos e colocados em espera. Em agosto de 2019, a Justiça Federal do Amazonas decidiu que a ANM deveria limpar da sua base todos os requerimentos de pesquisa ou lavra que atingissem territórios indígenas no Estado.

“Não sabemos se a ANM irá estender essa limpeza a outros estados, mas é uma situação anômala existirem esses processos minerários. Já existe jurisprudência do STF que o direito dos indígenas independe da homologação da terra, ou seja, qualquer título incidente em terras indígenas, inclusive o minerário, deveria ser anulado. A ANM se finge de morta até para não ser processada pelos detentores desses títulos”, argumenta Santilli.

Procurada, a ANM e também a Funai não responderam aos questionamentos até a publicação.

Metodologia

Para chegar aos dados, a Pública utilizou a base de processos minerários da Agência Nacional de Mineração (ANM) e cruzou com o mapeamento de Terras Indígenas (TIs) da Funai, para identificar áreas de sobreposição dos processos com os territórios indígenas. Os processos minerários são registros na ANM que pessoas físicas e empresas precisam fazer antes de explorar qualquer mineral ou substância no subsolo brasileiro. Eles têm início com o pedido de autorização para se pesquisar a substância e seguem até à etapa final, quando pode ser concedida a licença para exploração ou garimpo. Todo processo demarca uma área de terra sobre a qual se pretende realizar as etapas para atividade mineradora.

O levantamento da Pública levou em consideração todos os processos incidentes em áreas indígenas em diversas fases do processo de demarcação. As terras indígenas podem ter sido homologadas sobre requerimentos minerários já existentes, mas estes não foram cancelados.

CARVÃO AQUI NÃO
Diga não ao carvão! Assine nossa petição:
https://campanhas.arayara.org/carvaoaquinao

Mobilização Nacional Indígena divulga nota de repúdio ao PL que regulamenta mineração e empreendimentos em terras indígenas

As organizações abaixo assinadas – indígenas, indigenistas, socioambientais e de defesa de direitos humanos -, a maioria membros da Mobilização Nacional Indígena (MNI), vêm manifestar veemente repúdio ao Projeto de Lei nº 191/20, encaminhado pelo presidente da República, Jair Bolsonaro, no dia 06 de fevereiro do presente ano, que tem por objetivo regulamentar a pesquisa e exploração de recursos minerais, o garimpo, a extração de hidrocarbonetos, bem como o aproveitamento de recursos hídricos para geração de energia elétrica em terras indígenas. O PL materializa o “sonho” do mandatário, que desde a sua posse defende o aproveitamento econômico de territórios indígenas, e o pesadelo para os povos indígenas.

Mais uma vez Bolsonaro reitera a sua política de desrespeito ao Estado Democrático de Direito, aos direitos humanos, à Constituição Federal e aos tratados internacionais que reconhecem os direitos indígenas. O Projeto de Lei 191/20, encaminhado à Câmara Federal, propõe a liberação dos territórios indígenas para exploração de minérios, recursos hídricos e até a agropecuária, sendo que na Constituição Brasileira é estabelecido como princípio que o governo federal tem o dever de proteger os territórios indígenas.

É flagrante a intenção do presidente da República e seus apoiadores de abertura das terras indígenas a grupos econômicos nacionais e internacionais. Trata-se de um projeto de morte para os povos indígenas, que virá na forma de descaracterização dos seus territórios, violação dos seus direitos e perda da sua autonomia, conquistados na Constituição Brasileira e em tratados internacionais. O Projeto de Lei é um caminho sem volta ao direito ao usufruto exclusivo dos povos indígenas sobre o seu território.

O projeto também propõe o retorno da tutela, quando retira de forma falaciosa o poder de veto dos povos indígenas com relação à exploração de seus territórios, submetendo à aprovação do próprio Presidente da República, após uma consulta meramente protocolar para confirmar o empreendimento. Propõe também que a administração dos recursos financeiros caberá a um conselho curador que poderá ser formado por apenas três indígenas e que poderá definir as associações que legitimamente representam as ‐ comunidades indígenas afetadas.

O P.L. 191/20 é totalmente usurpador, autoritário, neocolonialista, violento, racista e genocida, sobretudo no que diz respeito aos povos indígenas voluntariamente isolados e de recente contato. O P.L. retoma uma perspectiva etnocida e genocida contra os povos indígenas, na contramão do que preconiza a Constituição Federal em seus artigos 231 e 232, e tratados internacionais, pois, além de propor a desestruturação das políticas de proteção, descaracteriza os territórios já regularizados e sinaliza com a não demarcação de novos territórios.

Manifestamos nosso repúdio e contrariedade sobre o referido Projeto de Lei e seus impactos imprevisíveis. Unimo-nos à luta dos Povos Indígenas do Brasil, no apoio irrestrito aos seus direitos originários.

Brasília, 12 de fevereiro de 2020.

Assinam:
Articulação dos Povos Indígenas do Brasil – APIB
Articulação dos Povos Indígenas do Nordeste, Minas Gerais e Espirito Santo – APOINME
Articulação dos Povos Indígenas do Sul – ARPINSUL
Associação Floresta Protegida
Associação Indígena Moratu do Xingu – AIMIX
Aty Guasú
Centro de Trabalho Indigenista – CTI
Comissão Guarani Yvyrupa
Comitê Nacional de Defesa dos Territórios Frente a Mineração – CNDTFM
Conselho das Aldeias Wajãpi – Apina
Conselho Indigenista Missionário – CIMI
Conselho Terena
Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira – COIAB
Indigenistas Associados – INA
Instituto de Estudos Socioeconômicos – INESC
Instituto Internacional de Educação no Brasil – IIEB
Instituto de Pesquisa e Formação Indígena – IEPÉ
Instituto Socioambiental – ISA
Operação Amazônia Nativa – OPAN
Rede de Cooperação Amazônica – RCA
Greenpeace
Instituto Sociedade, População e Natureza – ISPN
Movimento dos Atingidos pela Mineração – MAM

Bolsonaro assina projeto que regulamenta garimpo em terras indígenas

Bolsonaro assina projeto que regulamenta garimpo em terras indígenas

O presidente Jair Bolsonaro assinou nesta quarta-feira (5) um projeto de lei que regulamenta o garimpo e a exploração de energia e petróleo em terras indígenas. O envio do texto ao Congresso ocorrerá nos próximos dias e, na prática, é um complemento do artigo 231 da Constituição Federal. O projeto de lei precisa ser aprovado pela Câmara dos Deputados e pelo Senado.

De acordo com a proposta, empresas poderão realizar a exploração de minério em território demarcado quando houver consentimento dos indígenas donos das terras. Os índios não terão poder de veto caso haja exploração de petróleo ou energia em seu território, mas, para que ocorra, será necessário “dialogar” para buscar um consenso com a comunidade local.

De acordo com a subchefe de Articulação e Monitoramento da Casa Civil, Verônica Sanches, a proposta é fruto de determinação do Tribunal de Contas da União (TCU), que mandou o governo propor o mais rápido possível a regulamentação do artigo constitucional. Para ela, o projeto também levar desenvolvimento das comunidades indígenas e da região Norte.

Representantes indígenas não concordam com a proposta

Em novembro, ativistas de tribos indígenas mostraram inconformidade com o projeto. Em carta aberta lida no dia 26 daquele mês no Congresso Nacional, por iniciativa da coordenadora da Frente Parlamentar Indígena, deputada federal Joênia Wapichana (Rede-RR), os indígenas afirmaram: 

“Nós não queremos garimpo em nossa terra. Nós queremos que o governo cumpra seu dever de proteger a nossa terra. Queremos que o governo tire os garimpeiros que estão na nossa terra e impeça a entrada de mais garimpeiros. Nós conhecemos nossos direitos e sabemos que o garimpo na Terra Indígena Yanomami é ilegal.” 

Em comunicado assinado por sete associações, os indígenas denunciam as consequências do garimpo. “A gente decide de forma coletiva, escutando vários pensamentos de homens, mulheres, xamãs, jovens, lideranças tradicionais, todos reunidos. Isso é decidir em nome do povo e não de maneira autoritária. E isso deve ser respeitado pelo governo brasileiro. O governo não decide por nós. Somos guerreiros Yanomami e Ye’kwana e dizemos todos juntos: Fora Garimpo!”.

E prosseguem: “Os garimpeiros estão envenenando as pessoas e contaminando nossos rios, nossos peixes, nossos alimentos e espantando nossa caça. Sabemos que o mercúrio usado no garimpo está contaminando nosso povo. No rio Uraricoera, mais de 90% das pessoas que foram analisadas apresentaram alto índice de contaminação. Recentemente soubemos que mais da metade dos Yanomami de Maturacá também estão contaminados. O governo tem o dever de acabar com isso e trabalhar para cuidar da saúde dos povos Yanomami e Ye’kwana e proteger a terra-floresta”, segue a carta.

As lideranças ianomâmis disseram que os garimpeiros “trazem todo tipo de bebidas, drogas e doenças”, que têm “muitas armas” e são “violentos também entre eles”.

“Eles matam uns aos outros e enterram os corpos na beira dos rios ou jogam nos rios. Quando os garimpeiros mexem na terra e destroem a natureza, eles estão ofendendo os seres que vivem na floresta. Esses lugares foram destruídos e ninguém mais pode usar lá. A natureza está se zangando, e todos nós vamos sofrer, indígenas e não indígenas. Os garimpeiros são invasores que roubam o ouro, que tem que ficar embaixo da terra.”

Os indígenas escreveram que as suas verdadeiras riquezas “são os conhecimentos tradicionais, a nossa saúde, nossos rios limpos e nossas crianças crescendo felizes. Os garimpeiros estão destruindo a nossa riqueza. O nosso trabalho não é o garimpo, o nosso trabalho é a roça, é o artesanato, temos nossas formas próprias de gerar renda a partir de nossos conhecimentos sobre a floresta. Nossos conhecimentos têm mais valor que o ouro”.

*Com informações da Folhapress e GZH